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quinta-feira, outubro 26, 2006

MAT'ÉRIA MUITO INTERESSANTE PARA TODOS NÓS DE ARTES PLÁSTICAS, NÃO DEIXEM DE LER.

Artigo publicado na revista eletronica Tropico
muito interessante
abraços
fernanda


HISTÓRIAMoMA

(re)descobre a América LatinaPor Ana Letícia FialhoMostra apresenta museu como precursor do reconhecimento da arte latino-americana"MoMA at El Museo: Latin American and Caribbean Art from thecollection of the Museum of Modern Art", em cartaz até o fim de julhono Museo del Barrio, em Nova York, se propõe a desvendar os mistériosde uma coleção que ficou mais de 40 anos no anonimato. A idéia centralda exposição, na qual insistem os organizadores, é apresentar o MoMAcomo o precursor mundial no reconhecimento da arte da América Latina edo Caribe. Infelizmente, a exposição acaba sendo a prova de que ogrande templo da arte moderna passou ao largo de boa parte do que seproduziu em termos artísticos ao Sul do continente americano.As 158 obras, selecionadas entre mais de 2.000 objetos, em nadarefletem a riqueza e o interesse da produção artísticalatino-americana. Do ponto de vista estético, a exposição édecepcionante, embora inclua artistas excelentes.O projeto conceitual parte de outra premissa, igualmente questionável:a própria existência de uma "coleção de arte latino-americana". O fatoé que tal "coleção" é uma ficção, ou era, até recentemente. O conjuntode objetos, acumulados desde os anos 30, não permite qualquer analogiaaos diversos movimentos artísticos e, muito menos, possibilitam areconstituição de uma história da arte latino-americana.Invisível, dispersa em vários departamentos, esquecida nas reservas,pouco estudada e menos ainda exposta, a "coleção" fora vista pelaúltima vez em "Latin American Art 1931-1966", mostra organizada porAlfred H. Barr, diretor-fundador de MoMA, em 1967.Vale lembrar que a organização estrutural do museu é fundada nummodelo que atende aos ideais de uma história da arte moderna, no qualdevem prevalecer os valores estéticos "universais". Nela, uma coleçãode arte latino-americana -organizada segundo critérios geopolíticos-não pode existir, pelo menos não formalmente. No MoMA, as competênciasdos curadores e a organização/classificação dos objetos se dividem emcategorias bem definidas e tradicionais: departamentos de escultura,de pintura, de desenho, de gravura.Nesse contexto, os agentes do museu, em sua maioria, parecem não terreconhecido na arte produzida na América Latina os altos valoresestéticos que buscavam integrar em suas coleções. Houve, entretanto,alguns períodos e sobretudo personagens de exceção; e é justamentesobre eles que a curadoria se apóia na tentativa de justificar asmuitas lacunas e de dar certa coerência ao conjunto de obras díspares.É na reconstituição histórica dos momentos de maior dinâmica naspolíticas de aquisição de obras provenientes da América Latina e doCaribe -apresentada em quatro segmentos- que reside o maior interesseda mostra, ainda que se possa questionar a interpretação dos fatosproposta pela curadoria.Anos 30. Abby Aldrich Rockefeller, uma das fundadoras do Museu de ArteModerna, doa, em 19351, uma série de trabalhos de Orozco, Siqueiros eRivera, iniciando assim o que hoje se apresenta como "a coleçãolatino-americana". O museu logo adquire outras obras de artistasmexicanos e de outros países da América Latina. Destaque para oconjunto de aquarelas que Diego Rivera produziu sobre Moscou ("My day,Moscow", 1928) e "Suicídio coletivo" (1936), de Siqueiros.Não havia,entretanto, uma coleção à parte, simplesmente o desejo de Alfred Barrde formar uma coleção de arte moderna internacional2, engajada em oseu tempo.A respeito do mesmo período, a curadoria tenta sustentar que o MoMAnão só foi o precursor no reconhecimento da arte latino-americana,como também a primeira instituição a colecioná-la. Tal procedimentodeixa entrever um certo imperialismo da instituição, que, com acriação/reconhecimento a posteriori de uma categoria (arte-latinoamericana), auto-promove-se, apresentando-se como precursora mundial,"a primeira instituição de proeminência internacional a dar atenção erecursos à America Latina…", segundo a ênfase do diretor do Museo delBarrio, Julian Zagazagoitia, no catálogo.Mas, na França, o Museu de Grenoble adquiriu obras de Rego Monteiro("Os Boxeadores", 1927) e de Tarsila do Amaral ("A Cuca", 1924) em1928 e 1926, respectivamente, ou seja, antes mesmo do MoMA ser criado.Anos 40. O aspecto mais interessante desse período são as relaçõesentre arte e política. O MoMA, com a anuência de seus dirigentes,serviu de base para projetos diplomáticos. Como parte das estratégiasde controle ideológico durante a guerra, o governo federal nomeou umagente que, em nome do museu, viajou pelo continente não somentefazendo aquisições, mas também enviando relatórios sobre a vidapolítica e social dos países visitados. No mesmo contexto foi fundadoo Fundo Interamericano, anonimamente financiado por Nelson Rockfeller,o que permitiu ao museu a aquisição de grande número de obras, além darealização de exposições dedicadas a artistas latino-americanos.Durante esse período entram para coleção Portinari ("The Hill", 1933),Guignard, Maria Martins ("O Impossível III", 1946) , Torres-García,Frida Kahlo ("Auto-retrato com cabelo cortado", 1940), Wilfredo Lam,Roberto Matta, entre outros. Apesar da excelência de alguns artistasdesse período, suas obras foram poucas vezes expostas, a maioria tendosido guardada nas reservas após a aquisição3. Passada a guerra, asatenções foram desviadas da América Latina.Década de 60. Período de renovação do "interesse" do museu pelaAmérica Latina. É também o momento em que o governo americano, comoparte da batalha anti-comunista, cria a Aliança para o Progresso,programa internacional de patrulha ideológica camuflado de programa decooperação ao desenvolvimento econômico, social e cultural. Aumenta onúmero de exposições dedicadas à América Latina. O FundoInteramericano retoma fôlego, e assim obras de Gego ("Sphere", 1959),Julio Le Parc, Jesus Soto, Cruz-Diez entram para a coleção do museu,constituindo, de certa forma, um conjunto de qualidade, emborabastante incompleto, de arte construtiva.Outros fatores intervêm no aumento da "coleção": artistaslatino-americanos residindo em Nova York -como Botero- têm obrasadquiridas por Barr, e dois curadores especialmente interessados pelaAmérica Latina -William S. Lieberman e Elaine L. Johnson- viajam pelocontinente e fazem aquisições para o museu. O projeto de se constituirum núcleo especializado em América Latina, proposto por Johnson, acabasendo indeferido por "falta de verbas".Aquisições recentes. O último módulo, cujo foco é a artecontemporânea, apresenta alguns nomes de alcance internacional: DorisSalcedo ("Untitled", 1995), Felix Gonzalez-Torres ("Untitled","Perfect Lovers", 1991), Vik Muniz, Cildo Meireles ("Thread",1990-95), Los Carpinteros ("Coal Oven", 1998), Ana Mendieta ("Nileborn", 1984), Waltércio Caldas ("Mirror of light", 1974), HélioOiticica… Observa-se, entretanto, que, como nos módulos precedentes,boa parte das obras foi incorporada à coleção através de doações decolecionadores, de fundações e de artistas, e confinada nas reservas:"Muitas das peças nunca foram vistas antes, e proximamente muitasvoltarão às reservas, onde não poderão mais ser vistas", declarou odiretor do Museo del Barrio ao jornal "Daily News"4.É evidente, em todos os segmentos, que o MoMA nunca foi movido pelosimples desejo de promover a arte pela arte. Se houve momentos demaior interesse pela produção latino-americana e caribenha, foi pelaconfluência de determinantes gerais (interesses políticos, econômicose sociais) e determinantes específicas (trajetórias e interesses dedeterminados agentes: curadores, colecionadores, mecenas).Na fase atual de redinamização da coleção de arte latino-americana,tem fundamental sido a influência de Patrícia Cisneros. Graças a ela,a coleção tem tomado novos rumos. Além de doações diretas, acolecionadora venezuelana financia diversos projetos. Foi graças a seulobby que se estabeleceu o cargo de curador-adjunto, reservado acuradores latino-americanos. A posição foi ocupada primeiramente porPaulo Herkenhoff, substituído agora pelo venezuelano LuisPerez-Oramas, também consultor da Fundação Cisneros.O museu acaba de inaugurar uma biblioteca dedicada à artelatino-americana e, recentemente, passou a integrar, no seu quadrofuncional, especialistas na matéria, como é o caso do Miriam Basilio,curadora-assistente, responsável por grande parte da rigorosa pesquisasobre a história do MoMA, suas relações com a América Latina, suaspolíticas de aquisição e de exposição, assim como sobre a históriaespecífica das exposições de arte latino-americana nos Estados Unidoscujos resultados estão apresentados no catálogo da exposição.Existe um fundo para financiar viagens de curadores do museu à AméricaLatina e outros programas na área de arte-educação, formação paracuradores, circulação de exposições. Três publicações estão sendoorganizadas e deverão contemplar textos de críticos latino-americanos(uma delas dedicada a Mario Pedrosa).Tantas iniciativas podem indicar uma certa abertura da instituição anovos horizontes artísticos e resultar, quem sabe, numa revalorizaçãoda arte latino-americana, como desejam seus defensores (entre elesalguns agentes do museu).Entretanto, a idéia da existência de uma "coleção latino-americana" àparte significa que esta ainda não alcançou status suficiente nointerior do MoMA, que, no caso da exposição, optou por uma parceriacom o Museo del Barrio, instituição interessante, mas ainda marginal,no circuito nova-iorquino. A predominância de obras sobre papel indicauma economia nos investimentos.E, considerando a moda da valorização das singularidades culturais noscircuitos da arte nos últimos anos e o fato de que os latinos setornaram a maior minoria dos Estados Unidos, pode ser que o museuesteja simplesmente dando mostras de um certo oportunismo. O tempodirá. Certo é que esse súbito interesse pela América Latina não égratuito -como nada, aliás, no âmbito das artes.Ana Letícia FialhoÉ critica independente, pesquisadora especialista em inserção da artebrasileira e latino-americana nos circuitos internacionais, doutorandana Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, em Paris (BolsaCapes).1 - Na época, a família Rockefeller já tinha interesses na América Latina.2 - No arrojado projeto de Barr, as obras mais antigas deveriam passarao Metropolitam Museum e ser substituídas por obras maiscontemporâneas.3 - "La jungle", obra de Lam, de 1943, foi uma das poucas exceções,exposta de forma permanente por muitos anos.4 - "Daily News", domingo, 14 de março de 2004.

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