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domingo, março 09, 2008

Matéria de Dyogenes sobre a mostra das MULHERES

só nos anos 60 que aparecem nomes femininos nas artes plásticas da Paraíba: Carmem Dea, Terezinha Camelo, a professora Lourdes Medeiros e a jovem promessa Celene Sitônio, entre outras.

Dyógenes Chaves, Artista visual e crítico de arte (ABCA)

Fazendo uma análise da produção brasileira nas artes plásticas é notório o reconhecimento da presença feminina em apenas identificá-las como "artistas" amadoras, ou seja, não-profissionais. No início do século passado a crítica especializada, então porta-voz do campo das artes, já relutava em considerar as mulheres artistas como dignas de uma apreciação "séria". No artigo "Eternamente amadoras: Artistas brasileiras sob o olhar da crítica (1885-1927)", da professora Ana Paula Simioni, há várias citações de críticos e intelectuais como Monteiro Lobato, Felix Ferreira, Luis Gonzaga Duque-Estrada, João do Rio e Angyone Costa, em que, sistematicamente, tratam essa presença feminina através de metáforas como "sensíveis", "invasão", "decadência". Para eles essa invasão feminina era sinal de fraqueza de alguns salões de arte tornando-os um desfile de mediocridades.
Na Paraíba, nos anos 1920, a pintora Amelinha Theorga mereceu elogios de intelectuais nos jornais da época, mas, sua pequena atuação restringiu-se ao tempo em que era solteira. Provavelmente, também foi agraciada com adjetivos "bombons" como citado no famoso artigo "Paranóia ou mistificação?", de Monteiro Lobato, em que este desanda a julgar a obra de Anita Malfatti através de um olhar conservador e anti-modernista, apesar de "tentar" dedicar-lhe um tratamento de "profissional das artes", termo só atribuído aos homens.
A primeira exposição brasileira dedicada à presença feminina nas artes (São Paulo, 1960) afirmava em seu catálogo que antes das modernistas (p.e., Anita Malfatti e Tarsila do Amaral) houve apenas "heroínas melancolicamente frustradas que arrostavam incompreensões, preconceitos e caipirismos, numa época em que não havia salões nem galerias e em que seus pendores habituais se limitavam à arte aplicada das almofadas, rendas, bordados, flores artificiais etc.". Podemos imaginar que, como Amelinha Theorga, deve ter surgido outras "moças" na produção de pinturas em nossa terra, mas, diante deste tratamento excludente, parecem jamais terem existido, e seus nomes e trajetórias desconhecidas. É só aí, nos anos 60, que aparecem nomes femininos nas artes plásticas da Paraíba (Carmem Dea, Terezinha Camelo, a professora Lourdes Medeiros e a jovem promessa Celene Sitônio, entre outras) em meio a dezenas de poetas e artistas do sexo masculino.
Mas, é nos anos 1980 que, definitivamente, as mulheres paraibanas ganham destaque como artistas. Em que pese o pequeno número, é evidente a projeção de algumas artistas, como Alice Vinagre, dona de uma pintura expressionista vigorosa e ex-aluna da turma infantil (Profª Lourdes Medeiros) do Departamento Cultural da UFPB, que, após concluir o curso de Belas Artes na UFRJ passa a arrebatar prêmios em eventos nacionais. Entre outras, se destacam: Marlene Almeida, com uma obra de engajamento político-ecológico e nome fundamental na criação da Associação dos Artistas Plásticos Profissionais da Paraíba, vindo a ser, depois, coordenadora de artes plásticas da Funesc; Rosilda Sá, ceramista competente e pesquisadora nesta categoria; e, a pintora Maria Helena Magalhães, que veio de Belo Horizonte, onde concluiu o curso de Belas Artes. Hoje, as duas últimas são professoras do curso de Artes Visuais da UFPB.
Na arte naiff, há especial atenção para as artistas - inclusive, algumas já surgindo com certa idade - Dona Dalva, Dona Irene, Isa Galindo, Ana Pamplona, e a jovem Letícia Lucena (filha de José Lucena). Na arte da cerâmica, além de Rosilda Sá, aparecem Gina Dantas e Maria dos Mares. Na gravura, a religiosa Helle Bessa, Lívia Marques (atual professora da UFPB) e Carmem Trevas são nomes que se destacam desde o final dos anos 1970. Além de Rose Catão e Ivanusa Pontes, alunas de gravura de José Altino.
Paraibana, mas com cursos em Recife e no Rio de Janeiro, Fábia Lívia de Carvalho chega a ganhar prêmio no Salão dos Novos antes de fixar residência na Suíça, onde alterna estadia entre Basel e João Pessoa. Mesmo produzindo uma obra figurativa mais afeita ao mercado de arte local que às tendências contemporâneas, deve-se citar a escultora Rosa Queiroz e as pintoras Pepita e Dory Focke (mas, não atuam nos dias atuais). De Campina Grande, lembro de Lili Brasileiro e Zilene Neiva, surgidas na mostra Arte Atual Paraibana, em 1990, e Margarete Aurélio, hoje residindo em João Pessoa, esta, um raro talento no desenho à pastel.
Em meados dos anos 1990, com a criação do Centro de Artes Visuais Tambiá, capitaneado pela família Almeida (Antonio, Marlene e José Rufino), suas atividades fomentam importante intercâmbio com a Alemanha e promovem o surgimento de várias artistas de talento, entre estas, destaque para Célia Araújo, Neuma Sales e Alena Sá (breve lançando livro, o resultado de suas pesquisas sobre a COR). Já nos anos 2000, a Associart (que, apesar do nome, não é a mesma associação dos artistas dos anos 70) junta um grupo de jovens senhoras, algumas ex-alunas do CAVT, dispostas a organizar exposições de artes plásticas.
Diz Ana Paula Simioni: "Compreender as razões da exclusão das mulheres do panteão artístico ultrapassa a perspectiva do simples 'resgate' de suas obras e trajetórias; implica um questionamento mais profundo sobre as razões e o modo com que se operou tal obscurecimento coletivo". Mas, estamos em novos tempos de emancipação da mulher e sua presença deve ser mais observada que apenas pelo viés de um suposto "feminino universal". Por mais que isso ainda esteja em nosso inconsciente "machista".

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